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“a thing of beauty is a joy forever”

Somos dessa matéria de que os sonhos são feitos.

Miranda, de John William Waterhouse (1875)

Como disse no início da pandemia, estamos vivendo num tempo sem tempo. Pelo menos eu estou. Enquanto escrevo, Billy Joel canta Vienna no meu fone de ouvido: slow down, you're doing fine, you can't be everything you wanna be before your time. Eu acredito nisso. E vivo nesse ritmo mesmo, às vezes dançando, às vezes quase me arrastando da cama tal qual uma zumbizinha que ainda não entendeu como funciona a sua nova coordenação motora. 

Bem, é a vida. 

A verdade é que eu não me importo de estar sozinha. E talvez seja isso o que me incomode a ponto de escrever sobre. Não deveria me incomodar? Para alguém que gosta tanto assim dos poetas Românticos, eu sou prática demais. 

Às vezes me pergunto se eu perdi a capacidade de viver um grande amor da forma como ele deve ser vivido, com grandes gestos, sentimentos que mal cabem no peito e uma vontade incontrolável de sair correndo para os braços do outro. 

[why do I find it hard to write the next line? I want the truth to be said.]

Acho que todos esses anos de espera, de estudo, de deixar para lá tantas coisas para me dedicar a um objetivo, tudo isso me tornou muito pacienciosa. Eu certamente não tenho mais a pressa que eu tinha quando era adolescente. E embora os meus sentimentos sejam intensos, eles são bem mais tranquilos. Não é mais a intensidade de uma tempestade, mas a profundidade de um lago - calmo, ainda que profundo. (O que é uma metáfora clichê, porém não menos verdadeira.) 

[nothing is gonna change my world]

Sinto como se algo estivesse prestes a acontecer, e se eu ficar quietinha, fazendo as minhas coisas, sem fazer grandes gestos movidos pela pressa e pelo desejo de viver algo poético e enorme e bonito, as coisas vão se acertar. É como se algo estivesse em movimento. Tudo o que me trouxe até aqui parece ter me preparado para algo. E é estranha a maneira como as arestas têm se acertado, especialmente desde o início deste ano. Tudo o que sobrava de triste e perturbador foi sendo transformado, resolvido. Me sinto contemplando uma parte sem entender ainda o todo, mas apreciando a beleza e tranquilidade da vista mesmo assim. Algo está vindo. Eu não sei o que é, ou quando virá, mas sei que está vindo. O tempo é de silenciar, de aquietar, de respeitar o ar parado e suave que antecede os grandes eventos. 

Se a água parece rasa, é só porque ainda não mergulhamos nela. 

[les ailes des moulins protègent les amoureux]




*o título faz referência à peça a tempestade, de william shakespeare. a citação completa é: “somos dessa matéria de que os sonhos são feitos. e a nossa vida breve é circundada pelo sono”. a referência existe porque, além de bonita, a pintura que coloquei aqui é uma leitura do pré-rafaelita john william waterhouse para a tempestade, retratando uma de suas personagens, miranda, antes da tempestade chegar. 

Comentários

  1. Acho que a pandemia mudou tudo. Não percebo mais o tempo como antes, não vejo a vida acontecer como acontecia antes. Ela me fez valorizar mais a minha companhia e parar de buscar ser feliz nos outros. Amo estar sozinha e fazer coisas sozinha e ser sozinha. Mas também amo estar com quem me faz feliz. Preciso de um equilíbrio para me sentir completa e feliz. Eu te sinto e entendo como se sente. Acho que você está vivendo sua liberdade de um jeito que ninguém nunca conseguiria nem entender.
    Abraços!
    claraaoliveira.blogspot.com/

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